
O ateu e o planetário.
Certo
professor, astrônomo de grande fama, era muito de um jovem médico que,
destituído de crenças religiosas, não acreditava fosse o Universo obra do Ser
Supremo.
Braile,
assim se chamava o professor, desejava vencer o ateísmo absurdo do amigo. Com
este objetivo, construiu um magnífico planetário, isto é, uma peça mecânica que
reproduzia o Sol e todos os planetas e seus movimentos e órbitas. O
interessante engenho se movimentava graças a um dispositivo especial. Os astros
nele representados iniciavam sua rotação em torno do Sol. Ao mesmo tempo que os
pequeninos satélites, com precisão matemática, movimentavam-se também em torno
dos respectivos planetas.
Braile
terminou a construção do planetário. Aguardou pacientemente a visita o amigo.
Certo dia ele apareceu. Após as primeiras saudações, entretiveram-se ambos em
agradável palestra até que, a certa altura, perguntou o professor, interessado:
- Afinal,
quais são as suas convicções religiosas?
- Ah –
replicou o médico, entre irônico e desencantado – Não vos supunha ainda apegado
a essas ideias do passado. Tudo quanto existe no mundo é obra do acaso.
Continuo convicto de que Deus é uma ilusão que tem dominado as criaturas desde
muitos séculos. Eu não creio em Deus. A natureza e o acaso são responsáveis
pela criação do Universo.
Braile não
deu resposta ao moço, a quem devotava grande afeto. Habilmente desviou a
conversa para outro rumo. Desejava, porém, mais do que nunca, despertar aquele
coração para a sublime verdade da existência do Criador.
Depois de
alguns instantes, como quem nada pretendesse, o velho professor convidou o
amigo a visitar seu modesto laboratório. Foi então que o jovem doutor se
deparou com o maravilhoso aparelho em que apareciam, em bem feita engrenagem, o
Sol com os seus nove planetas. O médico ateu, admirando o planetário, teceu
sobre ele grandes elogios, perguntando em seguida:
- Qual o
autor desse engenhoso instrumento?
Braile
mostrou na fisionomia enigmático sorriso e respondeu tranquilo:
- Não houve
autor algum. Ninguém fez este planetário.
- Como
assim? – replicou o médico surpreendido.
- É muito
fácil. Este aparelho apareceu aqui por uma simples e natural casualidade.
O moço
doutor olhou-o mais surpreendido ainda e, meio desapontado retrucou-lhe:
- Caro
professor, estou encantado com estre instrumento que desejo ardentemente
conhecer-lhe o autor. Peço-vos, pois, que não gracejeis comigo e dizei-me: quem
fez este planetário?
Mas Braile,
com o olhar brilhante e a voz séria e grave, tornou a dizer-lhe:
- Ninguém p
fez amigo, ou melhor, ele é obra do acaso.
- Zombas de
mim, professor – disse o moço, aborrecido. – Uma peça tão perfeita não pode ser
obra da casualidade. Onde se concebe um objeto assim, feito com arte e inteligência,
não ter um autor? Isso é impossível!
Então,
Braile falou carinhosamente:
- Ah! Este
planetário, reconhece você, não pode ser fruto da casualidade. Deve ter um
autor..., no entanto, é um simples instrumento. E o Universo com as suas
infinitas e insondáveis maravilhas? E a criatura humana cujo corpo é a mais
engenhosa máquina e cuja alma é sopro divino? Tudo isso é obra do acaso?
O jovem
médico baixou a cabeça, meditativo. Compreendera a intenção do velho professor.
Depois de meditar alguns segundos, olhou para Braile e estendeu a mão.
- Adeus! –
disse ele, comovido. – Adeus e... obrigado! Obrigado pela lição. Prometo-lhe
nela meditarei para chegar a melhores conclusões sobre o Autor da Vida.
Braile
abraçou-o, emocionado. Sabia que a semente que acabava de lançar naquele
coração germinaria e se transformaria em belos sazonados frutos.