Lei natural: definição e caracteres
A
lei natural é a lei de Deus. É a única verdadeira para a felicidade do homem.
Indica-lhe o que deve fazer ou deixar de fazer e ele só é infeliz quando dela
se afasta. São características fundamentais da lei de Deus: a eternidade e a
imutabilidade, atributos do próprio
Deus,
que a criou.
Todas
as leis [...] da Natureza são leis divinas, pois que Deus é o autor de tudo. O
sábio estuda as leis da matéria, o homem de bem estuda e pratica as da alma.
Entre as leis divinas, umas regulam o movimento e as relações da matéria bruta:
as leis físicas, cujo estudo pertence ao domínio da Ciência. As outras dizem
respeito especialmente ao homem considerado em si mesmo e nas suas relações com
Deus e com seus semelhantes. Contêm as regras da vida do corpo, bem como as da
vida da alma: são as leis morais. A lei de Deus está escrita na consciência. Em
razão disto, todos [...] podem conhecê-la, mas nem todos a compreendem. Os
homens de bem e os que se decidem a investigá-la são os que melhor a
compreendem. Todos, entretanto, a compreenderão um dia, porquanto forçoso é que
o progresso se efetue.
A
lei de Deus é continuamente revelada aos homens, não obstante estar ela escrita
na consciência, porque é passível de ser esquecida e desprezada pelo ser
humano. Quis, assim, Deus que ela fosse sempre lembrada 9. [...] Em todos os
tempos houve homens que tiveram essa missão. São Espíritos superiores, que
encarnam com o fim de fazer progredir a Humanidade.
Esses
missionários, porém, quando encarnados, podem ser influenciados pela vida no
plano físico e, cometendo enganos, induzem a Humanidade a se transviar por
princípios falsos. Isso aconteceu com [...] aqueles que não eram inspirados por
Deus e que, por ambição, tomaram sobre si um encargo que lhes não fora
cometido. Todavia, como eram, afinal, homens de gênio, mesmo entre os erros que
ensinaram, grandes verdades muitas vezes se encontram O amor ao próximo,
ensinado por Jesus, é um preceito que resume a lei de Deus. Certamente [...]
esse preceito encerra todos os deveres dos homens uns para com os outros.
Cumpre, porém, se lhes mostre a aplicação que comporta, do contrário deixarão
de cumpri-lo, como o fazem presentemente. Demais, a lei natural abrange todas
as circunstâncias da vida e esse preceito compreende só uma parte da lei. Aos
homens são necessárias regras precisas; os preceitos gerais e muito vagos
deixam grande número de portas abertas à interpretação.
Para
que seja mais bem explicitada, a lei natural pode ser dividida [...] em dez
partes, compreendendo as leis de adoração, trabalho, reprodução, conservação,
destruição, sociedade, progresso, igualdade, liberdade e, por fim, a de
justiça, amor e caridade [...]. *
Essa
divisão da lei de Deus em dez partes é a de Moisés e de natureza a abranger
todas as circunstâncias da vida, o que é essencial. Podes, pois, adotá-la, sem
que, por isso, tenha qualquer coisa de absoluta, como não o tem nenhum dos
outros sistemas de classificação, que todos dependem do prisma pelo qual se
considere o que quer que seja. A última lei é a mais importante, por ser a que
faculta ao homem adiantar-se mais na vida espiritual, visto que resume todas as
outras.
A
vivência da lei de Deus conduz o homem ao bem. E o [...] verdadeiro homem de
bem é o que cumpre a lei de justiça, de amor e de caridade, na sua maior
pureza. Por extensão, reconhece-se [...] o verdadeiro espírita pela sua
transformação moral e pelos esforços que emprega para domar suas inclinações
más.
Dessa
forma, tanto [...] quanto podemos perceber o Pensamento Divino, imanente em
todos os seres e em todas as coisas, o Criador se manifesta a nós outros –
criaturas conscientes, mas imperfeitas – através de leis que Lhe expressam os
objetivos no rumo do Bem Supremo.
Lembremo-nos,
pois, de que no concerto admirável da Criação, somente será
Possível
regenerar e burilar a nós mesmos para que a vida imperecível em nós se retrate
vitoriosa, mas não nos esqueçamos de que, apesar da grandeza cósmica, nosso
desequilíbrio no mal pode comprometer todo o sistema em que as Leis Divinas se
expressam, através do trono sublime da natureza [...]
A LUTA CONTRA O MAL*.
Humberto de Campos
De todas as ocorrências da tarefa
apostólica, os encontros do Mestre com os endemoninhados constituíam os fatos
que mais impressionavam os discípulos.
A palavra «diabo» era então
compreendida na sua justa acepção. Segundo o sentido exato da expressão, era
ele o adversário do bem, simbolizando o termo, dessa forma, todos os maus
sentimentos que dificultavam o acesso das almas à aceitação da Boa Nova e todos
os homens de vida perversa, que contrariavam os propósitos da existência pura,
que deveriam caracterizar as atividades dos adeptos do Evangelho.
Dentre os companheiros do Messias,
Tadeu era o que mais se deixava impressionar por aquelas cenas dolorosas. Aguçavam-
lhe, sobremaneira, a curiosidade de homem, os gritos desesperados dos Espíritos
malfazejos, que se afastavam de suas vítimas sob a amorosa determinação do
Mestre Divino. Quando os pobres obsidiados deixavam escapar um suspiro de
alívio, Tadeu volvia os olhos para Jesus, maravilhado de seus feitos.
Certo dia em que o Senhor se retirara,
com Tiago e João, para os lados de Cesaréia de Filipe, uma pobre demente lhe
foi trazida, a fim de que ele, Tadeu, anulasse a atuação dos Espíritos
perturbadores que a subjugavam. Entretanto, apesar de todos os esforços de sua
boa-vontade, Tadeu não conseguiu modificar a situação. Somente no dia imediato,
ao anoitecer, na presença confortadora do Messias, foi possível à infeliz
dementada recuperar o senso de si mesma.
Observando o fato, Tadeu caiu em sério e
profundo cismar. Por que razão o Mestre não lhes transmitia, automaticamente, o
poder de expulsar os demônios malfazejos, para que pudessem dominar os
adversários da causa divina? Se era tão fácil a Jesus a cura integral dos
endemoninhados, por que motivo não provocava ele de vez a aproximação geral de
todos os inimigos da luz, a fim de que, pela sua autoridade, fossem defi










nitivamente convertidos ao reino de Deus? Com o cérebro torturado por graves cogitações e sonhando possibilidades maravilhosas para que cessassem todos os combates
entre os ensinamentos do Evangelho e os seus inimigos,
o discípulo inquieto procurou avistar-se particularmente com o Senhor,
de modo a expor- lhe com humildade
suas ideias íntimas.












*
Numa noite tranquila, depois de lhe escutar as ponderações, perguntou- lhe Jesus, em tom austero:
— Tadeu, qual o principal
objetivo das atividades de tua vida?
Como se recebesse uma centelha
de inspiração
superior, respondeu o discípulo
com sinceridade:
— Mestre, estou procurando realizar o reino de Deus no coração.
— Se procuras
semelhante realidade, por que a reclamas
no adversário em primeiro lugar? Seria justo esqueceres as tuas próprias
necessidades nesse senti- do? Se buscamos atingir o infinito da sabedoria
e do amor em Nosso Pai, indispensáveis se
faz
reconheçamos que todos somos irmãos no mesmo caminho!
...
— Senhor,
os espíritos do mal são também nossos irmãos?
– inquiriu, ad- mirado,
o apóstolo.
— Toda a criação é de Deus. Os que vestem a túnica do mal envergarão
um
dia a da redenção
pelo bem. Acaso poderias duvidar disso? O discípulo
do Evangelho não combate propriamente o seu irmão, como Deus nunca entra em luta com seus filhos;
aquele apenas combate toda manifestação de ignorância,
como o Pai que trabalha
incessantemente pela vitória
do seu amor, junto da humanidade inteira.
— Mas, não seria justo – ajuntou o discípulo,
com certa convicção –
convocarmos todos os gênios malfazejos para que se convertessem à
verdade dos céus?
O Mestre, sem se
surpreender com essa observação, disse:
— Por que motivo
não procede Deus assim? ... Porventura, teríamos nós uma substância de amor mais sublime e mais forte que a do seu coração paternal? Tadeu, jamais olvidemos
o bom combate.
Se alguém te convoca ao labor ingrato da má semente,
não desdenhes
a boa luta pela vitória
do bem, encarando qualquer posição difícil como ensejo sagrado para revelares a tua fidelidade a Deus. Abraça sempre o teu irmão. Se o adversário do reino te provoca
ao esclarecimento de toda a verdade,
não desprezes a hora de trabalhar
pela vitória da luz; mas segue o teu caminho
no mundo atento aos teus próprios deveres, pois não nos consta que Deus abandonasse as suas atividades divinas para impor a renovação
moral dos filhos ingratos,
que se rebelaram na sua casa. Se o mundo parece povoar-se de
sombras, é preciso reconhecer que as leis de Deus são sempre as mesmas, em
todas as latitudes da vida.
É indispensável
meditar na lição de Nosso Pai e não estacionar a meio do caminho que
percorremos. Os inimigos do reino se empenham em batalhas sangrentas? Não
olvides o teu próprio trabalho. Padecem no inferno das ambições desmedidas?
Caminha para Deus. Lançam a perseguição contra a verdade? Tens contigo a
verdade divina que o mundo não te poderá roubar, nunca. Os grandes patrimônios
da vida não pertencem às forças da Terra, mas às do Céu. O homem que dominasse
o mundo inteiro com a sua força teria de quebrar a sua espada sangrenta, ante
os direitos inflexíveis da morte. E, além desta vida, ninguém te perguntará
pelas obrigações que tocam a Deus, mas, unicamente, pelo mundo interior que te
pertence a ti mesmo, sob as vistas amoráveis de Nosso Pai.
Que diríamos de um rei
justo e sábio que perguntasse a um só de seus súditos pela justiça e pela
sabedoria do reino inteiro? Entretanto, é natural que o súdito seja inquirido
acerca dos trabalhos que lhe foram confiados, no plano geral, sendo também
justo se lhe pergunte pelo que foi feito de seus pais, de sua companheira, de
seus filhos e irmãos. Andas assim tão esquecido desses problemas fáceis e
singelos? Aceita a luta, sempre que fores julgado digno dela e não te esqueças,
em todas as circunstâncias, de que construir é sempre melhor.
Tadeu contemplou o
Mestre, tomado de profunda admiração. Seus esclarecimentos lhe caíam no
espírito como gotas imensas de uma nova luz.
— Senhor – disse ele
–, vossos raciocínios me iluminam o coração; mas, terei errado externando meus
sentimentos de piedade pelos Espíritos malfazejos? Não devemos, então,
convocá-los ao bom caminho?
— Toda intenção
excelente – redarguiu Jesus – será levada em justa conta no céu, mas precisamos
compreender que não se deve tentar a Deus. Tenho aceitado a luta como o Pai me
envia e tenho esclarecido que a cada dia basta o seu trabalho.
Nunca reuni o colégio
dos meus companheiros para provocar as manifestações dos que se comprazem na
treva; reuni-os, em todas as circunstâncias e oportunidades, suplicando para o
nosso esforço a inspiração sagrada do Todo- Poderoso. O adversário é sempre um
necessitado que comparece ao banquete das nossas alegrias e, por isso, embora
não o tenha convocado, convidando somente os aflitos, os simples e os de
boa-vontade, nunca lhe fechei as portas do coração, encarando a sua vinda como
uma oportunidade de trabalho, de que Deus nos julga dignos.
O apóstolo humilde sorriu, saciado em sua fome de conhecimento, porém
acrescentou, preocupado com a impossibilidade em que se via de atender
eficazmente à vítima que o procurara:
— Senhor, vossas palavras são sempre sábias; entretanto, de que
necessita- rei para afastar as entidades da sombra, quando o seu império se
estabeleça nas almas?!...
— Voltamos, assim, ao início das nossas explicações – retrucou
Jesus –, pois, para isso, necessitas da edificação do reino no âmago do teu
espírito, sendo este o objetivo de tua vida. Só a luz do amor divino é bastante
forte para converter uma alma à verdade. Já viste algum contendor da Terra
convencer-se sinceramente tão-só pela força das palavras do mundo? As
dissertações filosóficas não constituem toda a realização. Elas podem ser um
recurso fácil da indiferença ou uma túnica brilhante, acobertando penosas
necessidades. O reino de Deus, porém, é a edificação divina da luz. E a luz
ilumina, dispensando os longos discursos. Capacita-te de que ninguém pode dar a
outrem aquilo que ainda não possua no coração. Vai! Trabalha sem cessar pela tua
grande vitória. Zela por ti e ama a teu próximo, sem olvidares que Deus cuida
de todos.
Tadeu guardou os esclarecimentos de Jesus, para retirar de sua
substância o mais elevado proveito no futuro.
No dia seguinte, desejando destacar, perante a comunidade dos seus
seguidores, a necessidade de cada qual se atirar ao esforço silencioso pela sua
própria edificação evangélica, o Mestre esclareceu ao seus apólogos singelos,
como se encontra dentro da narrativa de Lucas: — «Quando o espírito imundo sai
do homem, anda por lugares áridos, procurando, e não o achando diz: — Voltarei
para a casa de donde saí; e, ao chegar, acha-a varrida e adornada. Depois, vai
e leva mais sete Espíritos piores do que ele, que ali entram e habitam; e o
último estado daquele homem fica sendo pior do que o primeiro. » Então, todos
os ou- vintes das pregações do lago compreenderam que não bastava ensinar o
caminho da verdade e do bem aos Espíritos perturbados e malfazejos; que
indispensável era edificasse cada um a fortaleza luminosa e sagrada do reino de
Deus, dentro de si mesmo.
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